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Professora de Lingua Portuguesa e Literatura. Encantada e comprometida com a vida.

domingo, 26 de abril de 2009

À Amiga Rosana Celli

(Salvador Dali)


A querida amiga Rosana Celli, nascida da mais preciosa fonte.


Madrigal Melancólico
(Manuel Bandeira)


O que eu adoro em ti,
Não é a tua beleza.
A beleza, é em nós que ela existe.

A beleza é um conceito.
E a beleza é triste.
Não é triste em si,
Mas pelo que há nela de fragilidade e de incerteza.

O que eu adoro em ti,
Não é a tua inteligência.
Não é o teu espírito sutil,
Tão ágil, tão luminoso,
- Ave solta no céu matinal da montanha.
Nem a tua ciência
Do coração dos homens e das coisas.

O que eu adoro em ti,
Não é a tua graça musical,
Sucessiva e renovada a cada momento,
Graça aérea como o teu próprio pensamento,
Graça que perturba e que satisfaz.

O que eu adoro em ti,
Não é a mãe que já perdi.
Não é a irmã que já perdi.
E meu pai.

O que eu adoro em tua natureza,
Não é o profundo instinto maternal
Em teu flanco aberto como uma ferida.
Nem a tua pureza. Nem a tua impureza.

O que eu adoro em ti - lastima-me e consola-me!
O que eu adoro em ti, é a vida.

segunda-feira, 16 de março de 2009

segunda-feira, 5 de janeiro de 2009

(Cena do filme A Missão de Roland Joffé)



Vale a pena rever: pela trilha sonora, pela fotografia, pela brilhante atuação dos atores, pelo trabalho de reconstituição histórica e pela sensibilidade com que Roland Joffé trata um tema tão delicado. O vídeo traz uma pequena amostra de tudo isso. Deleitem-se!!!!!!


Sinopse: No século XVIII, na América do Sul, um violento mercador de escravos indígenas, arrependido pelo assassinato de seu irmão, realiza uma auto-penitência e acaba se convertendo como missionário jesuíta em Sete Povos das Missões, região da América do Sul reivindicada por portugueses e espanhóis, e que será palco das "Guerras Guaraníticas.
Palma de Ouro em Cannes e Oscar de fotografia.

Elenco: Robert de Niro, Jeremy Irons, Lian Neeson.

Trilha Sonora: Ennio Morricone

Contexto Histórico: Ao longo dos séculos XVI e XVII várias missões católicas foram criadas pelos jesuítas na América do Sul. Surgidas no século XIII, com as ordens mendicantes, esse trabalho de evangelização e catequese, desenvolveu-se principalmente nos séculos XV e XVI, no contexto da expansão marítima européia.
Embora tivessem como objetivo a difusão da fé e a conversão dos nativos, as missões acabaram como mais um instrumento do colonialismo, onde em troca do apoio político da Igreja, o Estado se responsabilizava pelo envio e manutenção dos missionários, pela construção de igrejas, além da proteção aos cristãos. Na análise de Darcy Ribeiro em "As Américas e a Civilização", as missões caracterizaram-se como "a tentativa mais bem sucedida da Igreja Católica para cristianizar e assegurar um refúgio às populações indígenas, ameaçadas de absorção ou escravização pelos diversos núcleos de descendentes de povoadores europeus, para organizá-las em novas bases, capazes de garantir sua subsistência e seu progresso".
Durante o século XVIII o movimento missionário enfrentou problemas na América do Sul, em áreas de litígio entre o colonialismo espanhol e português. No sul do Brasil, a população indígena dos Sete Povos das Missões, foi submetida pelo Tratado de Madrid (1750), um dos principais "tratados de limites" assinados por Portugal e Espanha para definir as áreas colonizadas.
Pelo Tratado de Madrid, ficava estabelecida a transferência dos nativos para margem ocidental do rio Uruguai, o que representaria para os guaranis a destruição do trabalho de muitas gerações e a deportação de mais de 30 mil pessoas. A decisão foi tomada em comum acordo entre Portugal, Espanha e a própria Igreja Católica, que enviou emissários para impor a obediência aos nativos. Os jesuítas ficaram numa situação delicadíssima, pois se apoiassem os indígenas seriam considerados rebeldes, e se contrário, perderiam a confiança deles. Alguns permaneceram ao lado da coroa, mas outros, como o padre Lourenço Balda da missão de São Miguel, deram todo apoio aos nativos, organizando a resistência desses índios à ocupação de suas terras e à escravização. Dá-se o nome de "Guerras Guaraníticas" para esse verdadeiro massacre dos nativos e seus amigos jesuítas por soldados de Portugal e Espanha. Apesar da absurda inferioridade militar, a resistência indígena estendeu-se até 1767, graças as táticas desenvolvidas e as lideranças de Sépé Tirayu e Nicolau Languiru.
No final do século XVIII, os índios já tinham sido dispersados, escravizados, ou ainda estavam refugiados, na tentativa de restabelecer a vida tribal, que os caracterizava antes das missões.
(Fonte: http://www.historianet.com.br/conteudo/default.aspx?codigo=107)



Kurosawa, Van Gogh e Beethoven

("Corvos" - Sonhos de Akira Kurosawa)

- Por que não está pintando? Pra mim, esta cena é inacreditável. Uma cena que parece pintura não faz uma pintura. Olhando com atenção, verá que toda a natureza tem a sua beleza. E, quando há essa beleza natural, eu simplesmente me perco nela. Então, como num sonho, a cena se pinta sozinha para mim. Sim, eu consumo este cenário natural. Devoro-o completamente! E então, quando termino, a imagem aparece completa diante de mim. Mas, é tão difícil segurá-la aqui dentro.
- E aí? O que o senhor faz?
- Eu trabalho, me esfalfo, arremeto feito locomotiva!
(Transcrição de um dos diálogos do episódio “Corvos” do filme Sonhos de Akira Kurosawa)

segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

Para iniciar bem 2009!! "Eu quero mais"

(Boats de Van Gogh)


Cais
(Milton Nascimento e Ronaldo Bastos)
Para quem quer se soltar invento o cais
Invento mais que a solidão me dá
Invento lua nova a clarear
Invento o amor e sei a dor de me lançar
Eu queria ser feliz
Invento o mar
Invento em mim o sonhador
Para quem quer me seguir eu quero mais
Tenho o caminho do que sempre quis
E um saveiro pronto pra partir
Invento o cais
E sei a vez de me lançar


Carlos Castañeda

Qualquer caminho é apenas um caminho e não constitui insulto algum - para si mesmo ou para os outros - abandoná-lo quando assim ordena o seu coração. (...) Olhe cada caminho com cuidado e atenção. Tente-o tantas vezes quantas julgar necessárias... Então, faça a si mesmo e apenas a si mesmo uma pergunta: possui esse caminho um coração? Em caso afirmativo, o caminho é bom. Caso contrário, esse caminho não possui importância alguma."

(Carlos Castañeda)

terça-feira, 28 de outubro de 2008

Presente do Escritor e Amigo Flávio Mello

(Imagem: Mulata em Rua Vermelha - Di Cavalcanti )
O PILÃO
ou canto ao tempo
(Flávio Mello)
Na entrada do casebre, ergueu a barra do vestido à altura dos joelhos, sentou-se num dos três degraus debaixo da alpendrada, despejou os grãos dentro do pilão e o acomodou entre as grossas e torneadas coxas. Socando e torcendo, enquanto o suor lhe umedecia o peito, despertando um par de mamilos agudos e delicados, assim, cantarolava cantigas que aprendera com a avó materna, escrava de um ontem meio que distante, porém tão próximo que ela, neta delgada, morena jambo, entardecer sobre mobília de jacarandá polido, ainda guarda nas costas as marcas da infância de grilhões e pelourinho.
Esmigalha os grãos já torrados e selecionados. O som do pilão é uníssono, assim como todo entardecer antes de ser engolido pelo lago e pela mata. Assim como o cantar das lavadeiras, o som se perpetua, fazendo-se parte de um coro de maritacas e araras azuis em revoada. O som das chinelas — em revoada — se espalha pela cozinha, a água no fogão à lenha borbulha, o som típico denuncia o tempo, estalos da madeira verde.
Apanha o coador de saco num armário de cor rosa descascado, despeja o pó dos grãos de café por ela moído, despeja a água fervente e a tintura escorre para dentro de uma chaleira improvisada. Sente dentre o aroma do café o cheiro da pesca, ouve entre o canto dos pássaros o som do remo, sente o toque delicado da chalana no pequeno cais na beira do lago, sente o braço peludo e musculoso do pescador agarrá-la por trás, sente o fluido escorrer por entre as pernas, já que calçolas não usava, sente os dedos grossos e sisudos percorrerem os pêlos eriçados, o aroma do café adentra a narina aberta, a barba roçando a nuca, o contorcer do pilão e as duas cinturas se unem, sente o membro rijo tocar-lhe as nádegas úmidas, sente o gosto da língua, da cachaça, um desmaio, um breve e delicado desmaio, e, desperta na cama, ouvindo o som do remo e o canto da maritaca se distanciando, se distanciando, se distanciando em revoada.
Flávio Mello: Escritor, Palestrante e Professor – leciona Língua Portuguesa, Literatura (Brasileira, Portuguesa, Africana e Infantil),
Para saber mais sobre Flávio Mello: